sábado, 14 de abril de 2012

O LOBO

Da névoa evaporada do asfalto,
Dali ele surgia,
Do respaldo de poeira cinzenta,
Nas super ligas de cobalto,
No hemisfério deturpado do olhar,
Congelado no inverno,
Dali ele crescia,
nesse entorno de acabamento moderno,
o mau perfeito e acabado,
do ser dilacerado,
dali ele renascia,
para o poente das mágoas sem retorno
dos magos sem contorno,
do diletantismo atrofiador de músculos,
e do sabores do bom gosto,
ele mentia,
e espreitava por de trás de cada porta
no paradeiro das memórias mortas
do ontem que não existia,
ali, no cético desejo de reviver o que não seria,
na decadência das notas,
amarradas na falsa filantropia,
ele existia,
e sadicamente lhe sorria,
e impertinentemente,
lhe envolvia,
e no toque tépido e lânguido de suas mãos
sentia,
todo o desejo do poder
todo o cruel amargo dissabor
de viver completamente só
numa solidão sem palavras para brindar
numa altura sem cumplicidade para respirar
o que sobrava do ar,
o que faltava do lar,
o que na ausência declamava os lugares vazios
numa imensa sala de estar,
disposta mesa sem convidados
esperados para jantar,
no declíneo do ser,
sem ter como estar,
ali ele dizia,
as palavras mais dóceis de um amor que não conhecia
e que porém,
dado o teor da necessidade de se iludir
ele fingia,
cada olhar,
na sua agonia
cada cor,
de sua poesia,
cada gesto de sublime satisfação
no calor de sua ironia,
ele dizia,
não temas, meu irmão,
estamos para além da solidão
e do querer estar perto
dos fantasmas vestidos de corpos
pelos corredores das imperfeições,
e justamente ai,
pálida feição do afeto em contradição
ele insistia,
e me erguia a mão
quando nada mais fazer poderia,
quando nada mais satisfaria,
o fogo,
ardente morte eterna do interno
quando ali aparecia
o lobo
devorador dos meus sonhos
esquecidos na taverna do inferno
dos olhos decepcionados,
maternos,
e sem dizer o que faria
me olhava subalterno,
em inaudível armadilha
sempre presente
sempre tenro,
na audível melodia
de um frágil espanto ao longo do dia,
quando sem saber
preso nesse mundo que não mais sairia
ele não mais sorriria,
quando eu,
preso nesse mundo que nem sequer sabia
que dentro de mim,
em fogo existia
era mastigado aos pedaços
pelo peso invisível e opressor
de sua aterradora companhia;
sem sequer se mexer
ele vencia
e sorria,
sem sequer os lábios tremer
quando dos caninos o meu sangue escorria
e seu vulto me dizia
palavras que uma alma não latia
uivos que humano não compreenderia
jamais,
em tudo aquilo que ele sonha e faz
jamais entenderia,
e poderia voltar atrás,
para enfrentar
o que no resto das horas de fogo
em olhos de lobo
se perdia...
o que nos últimos minutos do jogo
nos olhos do bobo
se iludia...
o que no meu túmulo para todo o sempre
arderia,
sem descanso,
sem sossego,
sem rogo,
com o passar das horas tardias
dependuradas na mandíbula do lobo
que dentro de mim,
meu irmao
nunca mais morreria...


FC

sexta feira, 6 de maio de 2011













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